Dia Municipal do Juremeiro é aprovado no Recife

A data, proposta na Câmara pelo vereador Rinaldo Junior e aprovada pelos vereadores, é uma reivindicação do povo de religiões de matriz afroindígena recifense e agora segue para a sanção do Prefeito João Campos
O Projeto de Lei Ordinária apresentado ainda em maio de 2023 pelo vereador Rinaldo Junior tem por objetivo instituir no Calendário Calendário Oficial de Eventos do Município do Recife o Dia Municipal do Juremeiro e Juremeira, sendo um reforço para lembrar que todas e todos os praticantes da Jurema Sagrada devem se orgulhar de sua religião e de sua crença.
Enquanto o Brasil é palco das mais diversas expressões religiosas, ainda é também um país com um alto índice de racismo religioso e situações de desrespeito às religiões. As religiões de matriz afro-ameríndias são as que mais sofrem com os crimes de intolerância religiosa, quadro que somente pode ser revertido com a conscientização da população e com informação.
A Jurema Sagrada é uma religião de origem indígena na qual seus praticantes aproximam-se de seus antepassados, mantendo um culto aos ancestrais. Pesquisas mais recentes sobre a Jurema a compreendem como um universo mítico-ritual de origem indígena, frequentemente presenciado na região Nordeste do Brasil desde o período colonial. A Jurema Sagrada tem seus primeiros registros realizados ainda no ano de 1758, outros registros datados desde o século XVIII, no sentido de criminalização da prática da Jurema Sagrada, associando o rito a atos de rebeldia religiosa dos indígenas.
A Jurema Sagrada é uma prática espiritual largamente difundida na zona da mata da Paraíba, Pernambuco, Alagoas e Rio Grande do Norte. É importante dizer que a jurema é uma árvore dos “gêneros Mimosa, Acácia e Pithecelobium” (SANGIRARD JR., 1983, p. 191), encontrada com bastante abundância no semiárido nordestino, e que, antes mesmo da colonização, era cultuada como um elemento sagrado por diversas etnias indígenas da região. A Jurema Sagrada é o melhor e o mais nítido dos exemplos desses processos de convergência afro-branco-ameríndia.
Sendo uma prática religiosa que resistiu até aos dias de hoje, a Associação Sociocultural Movimento Manajé, que tem como missão dar visibilidade e o reconhecimento da autenticidade de culto para todos os praticantes dessa religião tão marginalizada e apagada historicamente, desenvolveu em 2022 o Primeiro Encontro de Juremeiros e Juremeiras do Paulista e Região Metropolitana do Recife, momento este que se consolidou como mais um marco na autoafirmação dos povos tradicionais de todo o Estado e que levou mais de 500 pessoas a ocuparem o espaço público e a resgatar seu lugar de protagonistas na história.
A Jurema Sagrada também traz em seu contexto cosmológico uma presença histórica reconhecida pelo Estado: Malunguinho.
Malunguinho é o nome dado ao líder do Quilombo do Catucá, que se formou na primeira metade do séc. XIX na Zona da Mata Norte do Estado de Pernambuco e assassinado em 18 de setembro de 1835, considerado patrimônio negro e indígena do povo pernambucano.
A memória desse grande líder quilombola foi preservada no imaginário da Jurema Sagrada do Nordeste, deificando-o e fazendo dele o Malunguinho Divino, o Rei da Jurema em Pernambuco, título este pertencente unicamente a ele, que se apresenta espiritualmente em três formas: Mestre, Caboclo e Exu.
Não haveria data melhor para ser conhecida como Dia do Juremeiro e da Juremeira, do que a da morte do maior líder quilombola pernambucano e cuja memória ecoa nas loas, cânticos e histórias de todos os adeptos da Jurema Sagrada: 18 de setembro.
Nesse sentido, a Câmara dos Vereadores do Recife prestou este justo reconhecimento a esta religião tão popular no nosso país e Estado e que tanto contribui para a preservação das raízes afro-indígenas originais formadoras do nosso povo.